segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Por entre arrogâncias, acusações e flores


Caros Srs. Francisco Dutra e António Germano.

Foi com enorme apreço que recebi as vossas «cartas» e a flor do Sr. Francisco Dutra. Devo dizer que adoro o simples facto de vivermos num país, em que podemos argumentar e contra-argumentar em público e em privado. Porém, ficaria muito desgostoso, se não me reconhecessem a defesa dos meus valores, da mesma maneira como reconheço o vosso direito de livre expressão dos vossos valores, sem que os meus, nem os vossos prevaleçam como únicos. Aliás, à semelhança do que foi proferido por pessoa muito «douta» da nossa «praça» num debate televisivo emitido há relativamente pouco tempo.

Relativamente aos artigos de minha autoria, devo confessar que fiquei com a impressão que o que mais chocou o Sr. Francisco Dutra foi a comparação feita entre a Roménia Comunista e o Vaticano e não, tanto, a morte das mulheres que recorrem ao aborto voluntário clandestino.

Francamente!... Sr. Francisco Dutra, acha mesmo que quero impor os meus valores a alguém do Vaticano ou fora deste? Não reconhece a diferença entre laicismo e anticlericalismo? Para mim, e na visão laicista de Estado, a Religião deve ter o seu espaço na sociedade, mas nunca poderá, sequer, impor a sua doutrina aos cidadãos da República.

Sr. Francisco Dutra, peço imensa desculpa por lhe ter induzido em erro, pois não mencionei que a morte de oito mulheres por hora em resultado de aborto inseguro é um número de nível mundial. A propósito de números mundiais, sabia que a morte por aborto inseguro é a primeira causa de morte materna (a nível mundial)? Longe de mim, querer armar-me em moralista (religioso ou político) pois, sou um simples cidadão que tenta exercer a sua cidadania e sei admitir quando cometo um erro. Aliás, tenho provas disso mesmo, e na minha opinião assumir um erro não é sinal de fraqueza de argumentos, mas antes de honestidade.

Vou desconsiderar a comparação que fez entre corrupção e roubo com as mulheres que recorrem ao aborto clandestino tal como vou desconsiderar os pequenos indícios de comparação entre nazismo e comunismos sanguinários com a minha linha de pensamento. Que eu tenha conhecimento, os «skinheads» e os nacionalistas portugueses estiveram integrados em diversas marchas pelo “Não”, mas nem me passa pela cabeça confundir os argumentos do “Não” com o nazismo ou nacionalismo de cariz fascista. Além disso, esqueceu-se que há uma diferença enorme entre um acto voluntário e um acto obrigatório.

O Sr. António Germano, por sua vez, tentou encontrar outra forma de leitura dos números, por mim apresentados. Apesar, de nunca ter saído das excepções e das regras. De facto, as mulheres não abortam a «torto e a direito» (excepção), mas ninguém quer impor uma regra a quem quer que seja.

Sr. António Germano não queira impor consensos que não existem. O início da vida humana não está cientificamente reconhecido, embora respeite a sua crença e não a pretendo alterar. Porém, impor a sua crença como consensual é no meu entender abusivo, pois não é compartilhada por grande parte do mundo cientifico, médico, jurídico e religioso. Até o Vaticano diz que a ciência e a medicina não podem afirmar quando o feto se converte em Ser Humano, e os teólogos(as) não estão de acordo sobre o momento em que o feto adquire uma alma. Para ilustrar esta falta de consenso, devo dizer que um número considerável de cientistas de renome, inclusive onze prémios Nobel, explicaram perante o Supremo Tribunal dos EUA que a ciência não pode dizer quando começa a vida da pessoa. A Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé (Vaticano)[i] refere: “Esta declaração deixa expressamente de lado o problema do momento em que se infunde a alma espiritual. Não há uma tradição unânime sobre este ponto e ao autores estão divididos.”

Sr. António Germano fico contente por verificar que partilha o meu conceito de prevenção. De facto, a prevenção vai mais além do que o perfeito conhecimento técnico do funcionamento da coisa ou coisas, coisas essas que, até parece ter receio de mencionar pela designação própria (poderia fazer mil e uma interpretações, mas não o irei fazer). Porém, será sempre importante e essencial o acesso facilitado à contracepção (mesmo entre os jovens), pois sem termos essa garantia, não estaremos a realizar uma prevenção completa.

Sim, Sr. António Germano, os métodos contraceptivos são falíveis tal como as pessoas que os utilizam. Mas, esquece-se facilmente que, quer opte por abortar, quer quem opte por continuar uma gravidez sofre, sempre consequências, ou vai querer desvalorizar a dificuldade de quem decide ou decidiu abortar.

Para mim, para o Sr. António Germano e para o Sr. Francisco Dutra parece-me consensual que a gravidez e maternidade não são doenças, mas também quero acreditar que não são castigos.

Um bem-haja para o Sr. António Germano e para o Sr. Francisco Dutra.
[i] Declaración sobre el aborto provocado, México, Edições Paulinas, 1974, nota 19, pp.29-301

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Conclusões Regionais


Os resultados regionais do referendo sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez permitem-nos retirar duas conclusões:

A primeira conclusão detém-se na elevada abstenção, a qual poderá ser indicadora da indiferença dos(as) açorianos(as) por esta problemática ou a «vergonha» individual em assumir uma posição diferente relativamente a uma maioria muito mais perceptível e assumida. Porém, a primeira possibilidade parece-me ser a mais credível, dada a recusa dos(as) açorianos(as) em aceitar a realidade do aborto clandestino aliada a uma forte influência de uma cultura judaico-cristã.

Outra conclusão, prende-se com a vitória do «não» na Região Autónoma dos Açores, embora por uma vantagem menor do que a verificada no referendo de 98, o que se deve, em grande parte, às razões apontadas na primeira conclusão. Porém, e tendo em conta, a campanha pelo “Sim” nos Açores, notou-se uma clara evolução no modo e na quantidade de pessoas que se assumiram pelo “Sim”.

Felizmente, fazemos parte de um país, o qual na sua globalidade entendeu que não faria sentido continuar a tentar resolver o problema do aborto clandestino através dos tribunais ou «olhando para o lado» e esperando que tudo se resolvesse sem qualquer tipo de intervenção.

A região irá sentir a realidade da interrupção voluntária da gravidez, pois o problema deixará de «voar» para o continente e deixará de estar escondido debaixo do «tapete». Terá um impacto significativo na nossa sociedade, mas para evoluirmos necessitamos, por vezes, de reconhecer, sofrer e empenharmo-nos na resolução desta problemática.

O nosso objectivo será tornar a interrupção voluntária da gravidez rara, mas segura. Para tal, não podemos nos descuidar na prevenção e no apoio a uma maternidade e paternidade responsáveis. Por isso, se é verdade que gravidez e maternidade não são doenças, também é verdade que não são castigos.

terça-feira, fevereiro 13, 2007

A Razão do meu Atraso...



Foi difícil chegar ao trabalho, na Segunda-feira.

Eram enormes os engarrafamentos provocados por enormes filas de mulheres que desejavam abortar, num cenário previsto por alguns (ou maior parte) dos defensores do "Não". Todavia, felizmente, não cheguei atrasado ao trabalho nem assisti a grandes filas de mulheres desejosas por abortar. Aliás, tal como tive a ocasião de responder às pessoas que me deram os parabéns pela vitória: a minha consciência não se alterou de ontem para hoje. Sempre me considerei anti-aborto, mas nunca considerei impor a minha consciência aos outr@s. Esta mensagem nunca foi entendida durante a campanha, sendo, por vezes, vista como uma incongruência, o que não é.

Incongruente é alguém ser anti-aborto e abortar voluntariamente. Mas com esta alteração legislativa, ninguém será obrigado a abortar. Porém, esse é uma incongruência que só dirá respeito à pessoa que a cometer.

Incongruente é um(a) médic@ ser objector de consciência num hospital público e praticar abortos em clínicas privadas.

Não será incongruente o médic@ que apele objecção de consciência, mas que votou "SIM".

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Os números, a realidade e a inadequação da actual lei portuguesa.

As crenças, as convicções e os sentimentos são, exclusivamente, pertença da consciência individual de cada uma/um de nós, são questões do foro íntimo de cada pessoa, como tal, não são passíveis de serem racionalizados e, portanto, não são objectivos.

A análise de uma problemática de forma objectiva e racional tem, à partida, maior probabilidade de ser bem resolvida, do que uma análise à luz de crenças, de convicções e de sentimentos.

A situação problemática que se pretende resolver, em parte, com a consulta à população portuguesa, no Referendo do próximo dia 11 de Fevereiro, é o flagelo do aborto clandestino, em Portugal.

Passo a referir as principais razões que, na minha perspectiva, ajudam a uma análise objectiva e racional do problema e, consequentemente, justificam e legitimam o voto no SIM.

Estima-se que cerca de 19.000 mulheres portuguesas, por ano, fazem aborto na clandestinidade;

Recorrem aos serviços públicos de saúde, por ano, com complicações graves resultantes de terem feito aborto clandestino, cerca de 10.000 mulheres;

O aborto ocorre em mulheres de todas as idades, de todas as condições sociais e, sobretudo, em mulheres casadas;

De acordo com a actual legislação, só a mulher é passível de ser condenada não havendo consequências para o outro protagonista (o homem);

1em cada 5 mulheres que abortaram estava a fazer contracepção (os métodos contraceptivos também falham);

A maioria das mulheres – mais de 90% – que decide abortar fá-lo por motivos não contemplados na actual legislação e declara que foi uma decisão muito difícil;

A actual legislação já contempla a possibilidade da mulher abortar (má formação do feto, risco de vida para a mãe, violação) privilegia, portanto, a vida existente à vida emergente;

As 19.000 mulheres que, todos os anos, em consciência, decidem abortarem, por não desejarem aquela gravidez, sujeitam-se a serem perseguidas, enxovalhadas na praça pública, e, condenadas com uma pena que pode ir até 3 anos de prisão!

A actual lei, que penaliza as mulheres que abortem ilegalmente, é, no mínimo, injusta socialmente, totalmente desadequada à realidade portuguesa, e, obsoleta comparativamente às leis existentes na maioria dos países da Comunidade Europeia.

Face aos argumentos objectivos referidos, é minha absoluta convicção que só o voto no SIM irá ajudar a diminuir o número de abortos clandestinos, levará mais mulheres às consultas de planeamento familiar, obrigará o Estado a melhorar a acessibilidade das mulheres a essas consultas, dando, a mais mulheres, com relevo para as que menos poder de compra têm, a oportunidade de terem uma vida sexual mais saudável, mais liberta e, portanto, mais gratificante.

O voto no SIM é mais justo socialmente e é inclusivo, porque é o único que respeita a liberdade de cada mulher decidir em consciência!

VOTO SIM à despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado.
Movimento Cidadania e Responsabilidade pelo Sim

Maria da Natividade Luz
Vale a Pena ver este Clip

http://www.youtube.com/watch?v=HeTWIWQJ1EM

Só é pena, não conseguir "postar" como nos outros blogs. Mas, o que conta é a intenção!
3ª Assembleia de Movimentos pelo SIM

Será realizada, amanhã (dia 7 de Fevereiro) a 3ª Assembleia pelo "SIM", em Angra do Heroísmo, na sede do Alpendre (grupo de teatro), pelas 20 horas.

O debate é aberto ao público e conta com as presenças de:

João Pedro Barreiros (biólogo e docente da Universidade dos Açores)
Gonçalo Viola (Médico de Família)

Álvaro Borralho (Movimento Voto SIM)
Adriana Figueiredo (Em Movimento pelo SIM)
Representante a designar pelo Cidadania e Responsabilidade pelo SIM

Contamos com a tua presença !